Ainda é cedo para voltar a investir na Argentina

Em 12 de agosto, investidores viram a bolsa de Buenos Aires derreter 38% e o peso se desvalorizar 30% em relação ao dólar, em meio a preocupações com o desfecho das próximas eleições presidenciais. O medo de uma derrota de Mauricio Macri deu sequência a um forte movimento vendedor, com grandes instituições financeiras optando por zerar a exposição em Argentina.

Em meio ao aumento do estresse nos mercados, com a venda desenfreada de ativos argentinos e fortes perdas de fundos, inclusive brasileiros, uma parte dos investidores já se questiona se há espaço para aproveitar os preços mais baixos e voltar a alocar recursos no país.

Para Pablo Albina, diretor da gestora de recursos Schroders na Argentina, ainda é cedo para tomar esse tipo de decisão, embora a casa esteja analisando oportunidades naquele mercado. Em entrevista ao InfoMoney, o executivo disse que as atenções recaem especialmente sobre títulos emitidos por empresas e ações do setor de petróleo e gás.

Apenas como referência, as ações da petroleira estatal argentina YPF despencaram quase 17% no dia seguinte às primárias e acumulam queda de 28% desde então. Os ADRs (recibos de ações de empresas estrangeiras negociadas nos EUA), por sua vez, derretem mais de 40% desde as primárias.

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Fonte: Bloomberg

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“O projeto ‘Vaca Muerta’, que é uma das maiores formações de xisto do mundo, é muito atrativo. Nossa visão é de que o setor será apoiado por qualquer um que ganhe as eleições”, disse Albina, na entrevista.

Albina lidera há 17 anos a área de renda fixa da Schroders na América Latina. Responsável por administrar US$ 537 bilhões em recursos ao redor do mundo, a Schroders tem escritórios em 32 países. A gestora se estabeleceu na Argentina em 1932 e tem US$ 1,1 bilhão em fundos locais. No Brasil, a Schroders atua há 25 anos e tem mais de R$ 15 bilhões em ativos sob gestão, segundo informações disponíveis em seu site.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

InfoMoney: Como o senhor analisa a reação dos mercados após as eleições primárias na Argentina? 

Pablo Albina: Vamos começar com um pouco da história recente, pelo começo de agosto, uma semana antes das eleições. Todas as pesquisas estavam mostrando que as eleições primárias seriam apertadas, mas não se esperava muita diferença entre Mauricio Macri e Alberto Fernández.

Quando vieram os resultados das primárias, na noite de domingo (11), a diferença entre Fernández e Macri era de 15 pontos percentuais. Esse dado estava fora de qualquer estimativa de investidores e pesquisas e foi totalmente inesperado pelo mercado, então a reação do mercado foi muito aguda, e os mercados entraram em colapso, tanto os de títulos como os de ações.

IM: Quais são as suas perspectivas para o país? O senhor acha que esse sentimento de incerteza deve permanecer por mais tempo e afetar os mercados ao redor do mundo? 

PA: O que nós tivemos foi uma eleição primária, a oficial será realizada em 27 de outubro, então ainda não temos um presidente eleito. Temos um candidato com muito mais votos do que outro, mas que tem recebido reações negativas do mercado.

Estamos um pouco moderados em nossa visão de Alberto Fernández. Ele é especializado em direito criminal, é um político argentino muito experiente e já está envolvido nos governos há algum tempo. É uma pessoa muito pragmática. Claramente ele não é a figura que o mercado espera, mas é difícil dizer como será e vamos ter que esperar para ver.

IM: Se a oposição ganhar as eleições em outubro, quais deveriam ser as prioridades do novo governo em sua opinião? 

PA: Independentemente de quem vencer, as prioridades devem ser trazer estabilidade para a moeda, reduzir a inflação e tentar retomar o crescimento da economia o mais rápido possível. Enquanto isso, uma renegociação com o FMI e alguma solução para a rolagem da dívida de curto prazo certamente estarão em discussão.

Os dois candidatos têm sido muito moderados em seus discursos após o resultado das primárias eleitorais e têm tido um suporte para uma transição ordenada até que o próximo presidente tome posse, em dezembro de 2019.

IM: Como a Schroders estava alocada na Argentina antes dos resultados das primárias? 

PA: Posso dizer que temos uma posição muito conservadora em Argentina por conta das eleições e por um cenário de grande volatilidade. A Schroders tem cerca de US$ 500 bilhões em recursos ao redor do mundo e eu diria que nossa exposição em Argentina é menor quando comparada com as de outras gestoras.

Estávamos mais conservadores antes das primárias e não fizemos mudanças significativas em nossas alocações nas últimas semanas. Seguimos adotando uma estratégia mais defensiva e estaremos procurando por oportunidades quando a volatilidade dos spreads, de ações e do câmbio estiverem em níveis menores.

IM: Faz sentido aumentar a exposição em Argentina por conta da grande desvalorização recente dos ativos? 

PA: Achamos que é muito cedo para aumentar a alocação no país neste momento. Vamos esperar até o resultado das eleições gerais para que possamos ter uma visão mais clara das políticas públicas que o próximo governo deve implementar. Por outro lado, há diversas ações e bonds que estão ficando fundamentalmente baratos nos níveis atuais.

Acreditamos que há oportunidades em corporate bonds [títulos emitidos por empresas] e nas empresas do setor de petróleo e gás na Argentina por conta dos fortes fundamentos. Mas, novamente, é muito cedo para ter um call em algum ativo ou em títulos específicos.

O projeto “Vaca Muerta”, que é uma das maiores formações de xisto do mundo, é muito atrativo. Nossa visão é de que o setor será apoiado por qualquer um que ganhe as eleições. Por ser um projeto nacional e global, e não de um único governo, acreditamos que as oportunidades são atrativas e de longo prazo.

Todas as companhias relacionadas devem, eventualmente, mostrar bons resultados, independentemente de quem vença [as eleições]. Mas ainda é muito cedo para dizer, então estamos analisando cada nome individualmente e oportunidades antes de fazer qualquer investimento.

IM: E como os mercados emergentes se encaixam neste cenário? 

PA: Colocando um pouco de cor nos eventos recentes do mercado, acreditamos que a crise argentina é muito idiossincrática e não terá efeito contagioso em outros mercados emergentes nem no Brasil.

Fonte: Infomoney

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