O ataque por drones dos Estados Unidos que matou o general Qassem Soleimani, da Guarda Revolucionária Iraniana, gerou temores de um amplo conflito armado no Oriente Médio, podendo até mesmo opor superpotências como EUA, China e Rússia.
No mercado, a notícia foi muito mal recebida, levando o Ibovespa a três quedas consecutivas, interrompendo um ciclo de recordes para a bolsa brasileira. Vale destacar que, após subir 31,58% em 2019, a projeção de 11 casas de análise consultadas pelo InfoMoney era de que o índice superasse os 132 mil pontos ao final de 2020, representando uma alta de cerca de 15%. Mas será que o impacto realmente altera as projeções que apontavam para um novo rali das ações no ano?
De acordo com o analista Carlos Daltozo, da Eleven Financial Research, ainda não é hora de desmontar posições otimistas.
Ele explica que, apesar do bombardeio iraniano de ontem a bases iraquianas que tinham militares americanos, o cenário não muda para ações, pois o discurso apaziguador do presidente americano, Donald Trump, nesta quarta-feira (8) confirma que essa é mais uma guerra de retórica do que um conflito armado.
“Novos riscos foram incorporados na tomada de decisões dos grandes players, mas o mercado não está precificando uma guerra de grandes proporções no Oriente Médio”, aponta.
Para Daltozo, as peças do xadrez geopolítico estão em movimento, mas ainda não dá para saber até onde vai essa escalada no discurso. O analista entende que uma guerra neste momento, em um ano de eleições presidenciais nos EUA, está bem longe do cenário-base.
Em termos práticos, Alberto Bernal, estrategista global da XP Investimentos, entende que o principal risco associado a esse conflito EUA-Irã seria o fechamento do Estreito de Ormuz, que conecta o Golfo Pérsico e o Oceano Índico.
Atualmente, essa faixa de mar é uma das principais rotas de comércio de petróleo do mundo, escoando as exportações de diversos gigantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) como o próprio Irã, Iraque, Kuwait, Bahrein, Catar, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos.
Se o bloqueio realmente ocorrer, os custos para transportar o petróleo vão aumentar substancialmente, o que se refletirá nas cotações da commodity. Apesar dos EUA serem hoje bem menos dependentes do combustível que vem do Oriente Médio do que já foram no passado, uma vez que 59% do petróleo do país é produzido internamente à base de gás de xisto, a produção da região ainda é muito relevante. Vale lembrar que nada menos do que 30% do petróleo do mundo vem dos países ao redor da península arábica.
Como consequência, a Petrobras (PETR3; PETR4) se encontraria no dilema entre elevar os preços seguindo sua política de paridade com os valores internacionais do petróleo, arriscando uma nova greve de caminhoneiros, ou sofrer interferência política para segurar os preços, o que poderia pressionar a Bolsa.
O presidente da estatal, Roberto Castello Branco, negou a possibilidade da segunda opção ocorrer. Tranquilizando os investidores, ele disse que não recebeu “pedido, pressão ou sugestão para baixar preços”.
Alternativamente, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque revelou que o governo busca formas de compensar as oscilações do petróleo. “Já estávamos trabalhando há dois meses em propostas alternativas para não sermos afetados”, respondeu a jornalistas.
Na avaliação de José Faria Jr., sócio da Wagner Investimentos, é difícil adivinhar para onde vão os preços das ações brasileiras em um cenário de potencial conflito entre EUA e Irã, mas nada indica que alguma mudança vá ocorrer no quadro geral de bolsas globais caras e dólar estável em torno de R$ 4,00.
“Não vemos reversão neste momento do cenário para o Ibovespa, mas poderemos ter oportunidade de compra em níveis mais baixos. Quanto ao dólar, não é o melhor momento de compra, mas para quem está com pouca proteção, é importante considerar elevar a proteção com a cotação perto de R$ 4,05”, recomenda.
Daltozo vai na mesma linha, considerando que a tendência de alta da Bolsa segue firme. “Soluços vão acontecer, mas ainda esperamos 138 mil pontos para o Ibovespa no final do ano. Com esse cenário interno mais benigno [com taxas de juros baixas e perspectivas de aceleração da economia], não há motivos ainda para descartarmos as projeções atuais.”